Ucrânia: De uma noite calma para uma manhã terrível

Miraslava Polovko é uma jovem ucraniana que se cruzou com colaboradores da Missão Dom Bosco e que teve que fugir da guerra no seu país. Confidenciou, num português perfeito, que o inexplicável está a acontecer.

Imigrante em Portugal na sua infância e adolescência, Mira, como é carinhosamente chamada, voltou para a sua Ucrânia natal em 2012. Vive e trabalha neste momento em Praga. A sua mãe e o seu irmão Alex já se encontram de novo em Portugal. O seu pai, infelizmente, voltou para servir o seu país.

Mira recorda o dia 24 de fevereiro, dia que “virou do avesso a vida de todas as pessoas”. “É uma situação na qual é indiferente se és rico ou pobre. Se pensei que um dia poderia acontecer isto? Nunca! Viver no século XXI e ter que fugir do próprio país. E não é só fugir, mas fazer isso o mais rápido possível”, desabafa.

Do dia da fuga recorda o medo e a desorientação. “Foi uma manhã que relembro com arrepios, todos com um stress enorme, nervos e preocupação. Na altura não sabia o que fazer. Andava de um lado para outro sem saber, eu própria, por onde começar. Sim, percebia que o mais importante era levar os documentos. Mas lá me acalmei e comecei a fazer a mala. Coloquei algumas coisas para mim e algumas para o meu irmão Alexandre, de 8 anos. Lembro-me o quanto ele pedia para levar alguns brinquedos, mas com o stress que tinha na altura a tudo o que ele me pedia respondia ‘não’. ‘Alexandre, não! Temos que nos despachar!’”, recorda.

Enquanto colocava alguns pertences na mala, as lágrimas não paravam de cair. Mais difícil foi despedir-se dos familiares que não podiam sair da Ucrânia. “Os últimos beijos e abraços dados aos meus avós fazem-me chorar até agora”, conta lamentando não saber quando os voltará a ver e se os voltará a ver vivos.

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No meio do sofrimento o único conforto de Mira e da família é estarem em segurança. “Sim, hoje estamos longe do nosso país! Da nossa terra onde nascemos! Mas estamos longe do terror que se está a passar lá. Hoje já é o 24.º dia [12 de março] desde o começo da guerra na Ucrânia e cada dia que passa a situação no nosso país é mais terrível. Morrem crianças, bebés, mulheres grávidas e restante população. Pessoas que simplesmente queriam viver em paz”.

Mira recorda o acolhimento que recebeu em Portugal na infância, para onde imigrou com a mãe à procura de uma vida melhor. Aos seis anos, sem falar a língua e sem perceber o mundo à sua volta, não deixou de sentir o apoio que recebeu. “Criei amizade desde o primeiro dia na escola que dura até agora”. Mira recorda uma conversa que teve com a mãe. “Naquela altura disse à minha mãe que nunca tive um apoio tão grande de pessoas que não conhecia, e lembro-me que disse: ‘Mãe, as pessoas deste país, para onde viemos, elas são muito boazinhas’”.

“Dia 25 de abril farei 24 anos, e as minhas palavras não mudaram, com uma honra enorme volto a dizer as pessoas, deste país, são muito boas. Novamente, devido à guerra na Ucrânia, sinto um apoio enorme outra vez. Mas desta vez a vida resolveu dar voltas maiores, e agora ao escrever tenho lágrimas nos olhos. Novos amigos que apareceram nas nossas vidas e que com certeza a amizade vai durar longos anos! Pessoas encantadoras, com enorme coração, que não tinham obrigação de me ajudar a mim e a minha família. Não me canso de repetir, o vosso apoio e ajuda significam muito para mim”, conclui a jovem.

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