Coordenador da Equipa Provincial das Escolas Salesianas e Diretor Pedagógico dos Salesianos do Porto, Marco Silva, prepara proposta estratégica para tornar a oferta do ensino secundário mais atrativa e diferenciadora. Depois da realização do Fórum sobre o Ensino Profissionalizante, com alguns dos maiores conhecedores do sistema educativo português, Marco Dias revela porque é que o ensino profissional pode e deve ser uma escolha de mais alunos e famílias.
Pelo que ficou patente dos vários testemunhos apresentados no Fórum, existe um estigma em relação ao ensino e à formação profissional, não só em Portugal, mas também na Europa. Ao mesmo tempo, em algumas das economias mais fortes, como a Alemanha, a Áustria ou a Suíça, a percentagem dos alunos que escolhem um curso profissional é muito superior à média europeia. O que é que falta fazer para chegar à meta dos 50%?
A resposta é complexa, pois passaria por envolver ainda mais um conjunto de players, que estão intimamente ligados a esta oferta formativa, porque este ecossistema exige dinamismo e relevância. São as empresas que têm de incorporar estes recém-profissionais e valorizar as respetivas certificações e remunerações; são a organização e a força do trabalho que se têm de adaptar para criarem condições para que estes jovens prossigam os estudos e se especializem nas suas áreas; são as universidades que deveriam rever as condições de acesso dos alunos oriundos destes cursos; as escolas profissionais que poderiam potenciar a formação profissional/tecnológica numa vertente mais empreendedora, valorizando os projetos que nascem no âmbito da prova de aptidão profissional e projetando-os para o mercado através das plataformas de financiamento coletivo; é a orientação vocacional realizada nas escolas/clínicas que deve apresentar esta oferta formativa como uma opção segura, competente, inclusiva e equitativa, que contribui positivamente para o projeto de vida pessoal dos jovens; uma comunicação positiva e informada das escolas aos pais/encarregados de educação; um contacto mais sistemático das escolas com as empresas, para além das visitas de estudo; avaliar a implementação destes cursos nas escolas secundárias; atualizar a rede destas ofertas, em função das necessidades laborais, para se afetarem os recursos necessários que potenciem estas ofertas.
Até 1994, referiu o diretor-geral da DGESTE, o número de alunos portugueses nos cursos profissionais era muito baixo, entre 6 e 7%. Isto quer dizer que estamos a progredir bem?
São 39% os alunos que frequentam atualmente os cursos profissionais. Em 30 anos crescemos 33%. Mesmo assim, não estamos a crescer bem. Seria interessante aprofundarmos o percurso escolar destes alunos e verificar o que os caracteriza. Talvez se percebam algumas das razões do estigma a que está votada esta oferta formativa e a percentagem atual.
A qualidade, o nível de exigência na avaliação e as taxas de empregabilidade dos diplomados contrariam a perceção dos alunos e encarregados de educação portugueses, e também da opinião pública. Como alterar este quadro?
As expectativas dos pais/encarregados de educação estão centradas, essencialmente, e nesta faixa etária, no acesso ao ensino superior e na obtenção de um diploma de um curso superior e, para isso, o melhor veículo seria os cursos gerais. Seria interessante aprofundar as taxas de insucesso e mudanças de curso verificadas no ensino superior, para perceber melhor as finalidades e os propósitos dos cursos gerais e se haverá alguma correlação forte entre estas as percentagens e eventuais preferências dos alunos versus expectativas dos pais/encarregados de educação. Há necessidade de uma comunicação mais positiva para se dar um quadro de escolhas mais seguro e real aos alunos e às famílias. Por outro lado, este quadro seguro deveria ser ilustrado pelo dinamismo que esta oferta deveria perseguir. As empresas e as universidades deveriam descer até este nível e “recrutar” alunos, para integrarem grupos de criação e inovação de produtos/serviços. As escolas deveriam promover metodologias de aprendizagem em serviço nos seus contextos empresariais e desenvolverem projetos win-win, para que o foco do ensino-aprendizagem não fosse essencialmente académico, mas orientado também para a criação de valor, gerador de entusiasmo, motivação, formando um quadro de segurança mais ancorado.
No início do encontro, o Provincial explicou o objetivo do Fórum: uma oportunidade para as escolas salesianas refletirem sobre esta realidade e fazerem outros projetos para públicos diferentes. O que se pode esperar para os próximos anos?
Eventuais decisões estarão nas mãos do Pe. Provincial e do seu Conselho, e/ou nas mãos de alguma escola salesiana, que, por motivos estratégicos, educativos-pastorais, se queira antecipar e até facilitar na decisão. Penso que ficámos todos com a sensação de que há espaço para ampliar e diversificar esta oferta. Talvez haja territórios menos saturados do que outros e prioridades diferentes, por exemplo, no Sul, em concreto, na área metropolitana de Lisboa. Mas, avançar para a criação deste tipo de oferta, terá sempre de ser uma decisão estratégica, com destinatários e finalidades bem definidos, áreas profissionais relevantes, implementada em projetos educativos que congreguem e se completem e com um desenho curricular e pedagógico atrativo e inovador, que acrescente valor ao projeto de vida dos alunos.
Sobre o inquérito feito aos alunos salesianos, houve algum dado que o surpreendeu?
Sim, a opinião de quase 63% dos quase 2900 inquiridos ao mencionar que o ensino secundário deveria preparar os jovens para a vida profissional. E apenas cerca de 30% referirem que deveria preparar para o acesso ao ensino superior.
Da amostra de alunos que pretende escolher um curso profissional, 72,9% pensa continuar os estudos depois do 12.º ano. O ensino tem de ser mais prático?
Os alunos estão-nos a solicitar isso mesmo. Há necessidade de avaliar a construção das nossas matrizes e assumirmos a vanguarda do sistema e apresentar, no limite dos quadros normativos vigentes, propostas curriculares inovadoras, que respondam a estes reptos. A atual Proposta Educativa da Escola Salesiana lança os dados para possibilitar essa mesma resposta. A nossa pedagogia faz milagres!
Os Salesianos do Porto são, nos últimos anos, a única escola salesiana com ensino profissional, com o Curso de Planos de Próprios de Produção Gráfica. Têm perspetivas de desenvolver esta oferta com novos cursos?
Os cursos com Planos Próprios não são cursos profissionais, apesar de facultarem uma certificação profissional igual à dos cursos profissionais. São chamados cursos de dupla certificação, pois certificam para o mercado laboral e permitem que os alunos, ao terminar o 12.º ano, prossigam os estudos no ensino superior, uma vez que as disciplinas que se constituem como prova de ingresso integram a sua matriz curricular. Para desenvolver esta oferta, tal como está desenhada e tendo em conta que é uma oferta financiada pelos fundos sociais europeus, precisamos que haja abertura da tutela para o fazer. Mas, na lógica dos planos próprios, podemos fazê-lo, e temos vontade, desde que seja estratégia e haja recursos para concretizar essas ideias.
Que áreas gostaria de ver desenvolvidas a nível nacional da Província Portuguesa da Sociedade Salesiana?
Biotecnologia, Desporto, Energias, Indústrias Criativas, Performance, Programação, Química Aplicada e Mecatrónica, penso que seriam áreas a equacionar.
Têm dados sobre quantos alunos (dos Salesianos do Porto) destes cursos seguem para o Ensino Superior? Quantos conseguem colocação no mercado de trabalho?
Sim, porque fazem parte das metas contratualizadas com a entidade que financia estes cursos. No ano letivo anterior, cerca de 85% dos alunos prosseguiram os estudos no ensino superior, sendo que 15% prosseguiu estudos nas áreas do Design e afins, e no mercado de trabalho ingressaram 7%.
Apresentou um projeto em que está a trabalhar com vários parceiros e classificou-o de ambicioso. O que é? Ainda é cedo para revelar? Para quando?
É uma proposta estratégica para tornar a oferta do ensino secundário, nos Salesianos do Porto, mais atrativa e posicionarmo-nos como uma alternativa diferenciadora a todas as que existem na cidade do Porto. É ambiciosa, porque ultrapassa os limites do convencional das ofertas formativas do secundário, traz os parceiros para o currículo, junta alunos com os mesmos interesses, atualiza os currículos, preconiza uma aprendizagem ativa com capital tecnológico especializado e cria valor de uma forma relevante, com intuito de reter e atrair talentos. Ainda estamos numa fase de negociação com os parceiros e a desenhar a estrutura de custos. Já revelámos algumas ideias neste Fórum! Tínhamos apontado 2025/26. Estamos a dar passos.