A transformação do quotidiano

Uma vez que abrimos o coração ao amor de Deus, todo o nosso ser se ilumina a partir de dentro, porque a força do Espírito nos regenera.

Quero contar-te o que sucedeu a Miguel Magone. Depois da sua «conversão» a todos pareceu profundamente transformado.

Um dia o seu professor dizia-me: «Encanta-me muito a mudança que experimentou, tanto no aspeto físico como no seu comportamento moral.

Transformou-se num rapaz maduro, sem perder nada da sua serenidade e alegria e da exuberante vitalidade que lhe é própria. Agora o seu olhar e o seu rosto revelam uma interioridade conquistada. A sua conduta é exemplar em tudo. Poderia colocá-lo como modelo de virtude para os companheiros. Creio que esta mudança exterior provém de uma transformação espiritual». Eu, que tinha acompanhado a sua crise e o seu desenvolvimento, sabia que era exatamente assim. Desde que foi acolhido no nosso ambiente não encontrava gosto em nada, exceto no recreio.

Cantar, gritar, correr, saltar, fazer alvoroço, eram as coisas que satisfaziam o seu carácter fogoso e vivo. Mas quando o companheiro, que eu tinha colocado a seu lado, lhe dizia: «Miguel, a campainha chama-nos para o estudo, para a aula, para a oração…», lançava então um olhar compassivo para os divertimentos, depois, sem opor resistência, ia para onde o dever o chamava. De facto tinha-se comprometido comigo a fazer tudo com exatidão. Mas era verdadeiramente um espetáculo vê-lo no momento em que a campainha assinalava um intervalo ou o recreio. Parecia que saía da boca de um canhão. Voava por todos os cantos do pátio. Todo o jogo que exigia habilidade física era a sua delícia. O jogo a que chamávamos «barrarotta» era o seu preferido. Misturando assim o recreio com os deveres escolares, progredia de dia para dia.

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Depois de superada positivamente a crise interior, mudou a sua forma de ver as coisas. Para Miguel tudo adquiriu um sentido novo. Se antes parecia um cavalo desbocado, incapaz de realizar os deveres quotidianos, incapaz de aceitar qualquer disciplina, irrequieto durante as celebrações na igreja, agora parecia que tinha entrado numa nova dimensão. A sua índole fogosa, a sua ardente imaginação e o seu coração cheio de afetos, levavam-no naturalmente a ser vivaz. Contudo, no momento próprio sabia dominar-se e controlar-se a si próprio. O recreio fazia-o com todo o entusiasmo, mas dado o sinal para o estudo, aula, descanso, refeição, igreja, interrompia tudo de imediato e corria para cumprir os seus deveres.

Que tinha acontecido? A sua vida tinha encontrado um centro unificador e uma finalidade, alimentada pelo fogo interior do amor de Deus. A fé tinha-o introduzido num horizonte de transcendência e de liberdade.

Decidido a seguir Jesus, sabia agora abraçar generosamente a vida com as suas exigências e aceitar cordialmente o próximo na variedade dos temperamentos e dos sentimentos. Via tudo na perspetiva da vontade divina, aceite e cumprida, dando aos ritmos e às ações de cada dia um significado mais elevado, assumindo tudo a partir do ponto de vista do amor e orientando a um fim superior.

Estou profundamente convencido de que uma vida espiritual autêntica nos torna livres e fervorosos na ação: motiva a diligência no estudo, a atenção na aula, a obediência aos pais e superiores. Torna-nos fortes e serenos para suportar as contrariedades da vida, superando a sua imposição como uma necessidade frustrante e acolhendo-as como amor a Deus.

Recomendei sempre o exato cumprimento dos deveres, não por uma religião do dever, mas como expressão apaixonada e responsável de adesão à vida, lida a partir da perspetiva do Filho encarnado, que se despojou a si mesmo assumindo a condição de servo por amor.

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Para refletires

  • Dom Bosco une inseparavelmente vida espiritual e vida quotidiana: qual é o motivo?
  • Que se quer dizer, efetivamente, com a expressão «transformação do quotidiano»?

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