Irmanados no martírio, unidos no amor pelos Xavantes

No dia 1 de novembro de 1934, numa tentativa de aproximação da nova tribo dos Xavantes, no Brasil, eram massacrados os Salesianos missionários Pe. João Fuchs e Pe. Pedro Sacilotti.

O Pe. João Fuchs nascera em Pfaffnau, Suíça, a 8 de maio de 1880. Aos vinte anos, sentindo a vocação à vida religiosa, fora para Itália e, no Instituto Salesiano de Penango, preparara-se para seguir a voz do Senhor. Recebido o hábito religioso das mãos do Beato Miguel Rua, em 1906, partira para o Brasil, onde recebia a ordenação sacerdotal em 4 de fevereiro de 1912. Já sacerdote, continuou durante quase dois anos a dar aulas de Física e Matemática no mesmo instituto até que, surpreendido por uma doença, precisou de regressar à Europa para se restabelecer de saúde. Graças a Deus, recuperou a saúde e a 15 de agosto de 1920 chegava à “Colónia Sagrado Coração” (Mato Grosso) para se dedicar à evangelização dos índios Bororos, com admirável abnegação e espírito de sacrifício. O território missionário confiado à Congregação Salesiana e elevado a Prelazia Nullius em 1914, com o título de Registo do Araguaia, estendia-se por uma superfície de 246.800 km2 e contava com apenas 40 mil habitantes. Quando o Pe. Fuchs chegou à sua residência, muitas fibras de valorosos missionários já se tinham consumido não tanto pelo cuidado dos civilizados, dispersos pela vasta zona, quanto pela busca das tribos indígenas confinadas nas imensas florestas-virgens, com discreta correspondência dos Bororos. Todo o esforço, contudo, era astutamente frustrado pela tribo dos Xavantes.

O Pe. Pedro Sacilotti nascera em Lorena, São Paulo (Brasil), de pais italianos, a 11 de maio de 1889. Tendo crescido e sido educado no instituto salesiano da sua cidade natal, respondera com decisão à voz do Senhor e, vestido o hábito religioso em Lavrinhas, São Paulo, fizeram os estudos filosóficos com brilhante sucesso, tanto que os superiores pensaram em prepará-lo na Itália com os estudos teológicos no Estudantado Internacional Dom Bosco de Turim – Crocetta. Foi ordenado sacerdote pelo Cardeal Gamba na Basílica de Maria Auxiliadora a 12 de julho de 1925. Regressado à pátria, dedicou-se à assistência e ao ensino na sua Província e  em 1928 foi nomeado diretor do colégio de Registo do Araguaia. Mas não era a vida que sonhava. A sua alma ardente ansiava pelo apostolado missionário e só se sentiu feliz quando os superiores lhe confiaram a árdua missão dos Xavantes.

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A terrível tribo que há séculos fazia falar de si no Brasil vivia em aldeias espalhadas numa faixa do Mato Grosso, que abrangia centenas de quilómetros quadrados entre os rios das Mortes e Kuluene, o maior afluente do rio Xingu. O seu habitat era a floresta virgem, sem caminhos, onde só o índio que ali nasce se move com segurança. Desde 1932, o Pe. Fuchs projetara um plano de penetração. Remonta àquele ano a primeira cruz, de 5 metros de altura, que ele plantou no rio das Mortes. Em 1934, o Pe. Fuchs ficou sozinho em Santa Teresinha e pensou em transferir-se para Mato Verde, quase no limite sul da Prelazia, onde no início de setembro se juntou novamente ao Pe. Sacilotti, que vinha de Araguaia para trazer remédios, víveres e pessoal. Em pouco mais de um mês tinham a satisfação de ver pronta uma residência para os Salesianos e para as Filhas de Maria Auxiliadora. Vindo a saber que no rio das Mortes havia um grande número de jangadas, sinal da presença dos Xavantes, apressaram-se a subir até Santa Teresinha, onde chegaram em 24 de outubro. De lá, o Pe. Fuchs escreveu a sua última carta. “Vai-se aproximando a hora dos Xavantes e também a nossa hora…” O pressentimento correspondia exatamente à realidade. Como os Xavantes se escondiam e fugiam, era preciso ir em busca deles; poucos dias depois, os missionários partiram novamente de Santa Teresinha.

Foi a última viagem. Havia já algumas horas que tinham passado em São Domingos e desciam o rio, quando avistaram dois xavantes na margem. O Pe. Sacilotti e um bororo que o acompanhava, tendo desligado o motor para irem lentamente pela corrente, saltaram sobre uma pequena barca que levavam a reboque para chegar à margem, que era bem alta e íngreme. Lá em cima, o Pe. Sacilotti não viu ninguém; subindo a uma árvore avistou na densa floresta cerca de 50 xavantes. Chamou o Pe. Fuchs, falaram aos índios em língua carajá, mas estes responderam de longe em tom ameaçador; depois, enquanto os companheiros dos missionários voltaram à barca para ir buscar alguns presentes, ressoou um grito de guerra, ao qual se seguiu um assalto fulminante dos Xavantes. Ninguém testemunhou pessoalmente o que aconteceu em poucos minutos. Os dois missionários, tendo ficado sozinhos, foram mortos com as tremendas bordunas dos Xavantes, que os deixaram um ao lado do outro com a cabeça rachada.

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Aquele lugar é agora denominado nos mapas do Brasil como “Barranco dos Mártires”.

Publicado no Boletim Salesiano n.º 568 de Maio/Junho de 2018
Texto:
Pe. Pierluigi Cameroni, sdb, Postulador Geral para as Causas dos Santos da Família Salesiana, adaptado do opúsculo para o Dia Missionário Salesiano de 2017

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