Comentário ao Compêndio do Catecismo /45
Enzo Bianchi
A oração do Senhor contém sete petições a Deus Pai. As primeiras três, mais teologais, aproximam-nos d’Ele, para a sua glória: pois é próprio do amor pensar antes de mais n’Aquele que amamos. Elas sugerem o que em especial devemos pedir-Lhe: a santificação do seu Nome, a vinda do seu Reino, a realização da sua Vontade. As últimas quatro apresentam ao Pai de misericórdia as nossas misérias e as nossas expectativas. Pedimos que nos alimente, nos perdoe, nos defenda nas tentações e nos livre do Maligno.
(Compêndio do Catecismo nº 587)
O Pai-Nosso tem uma estrutura muito simples: uma invocação ao Pai, seguida de alguns pedidos, sete segundo Mateus, cinco segundo Lucas. Apesar desta diferença, a estrutura e o movimento geral da oração do Pai-Nosso não são alterados e o ensinamento de Jesus é preservado na sua essência pelas duas versões.
A invocação – como já vimos – é simples, não contém adjetivos nem apelativos, como se encontra, por exemplo, em numerosos Salmos: “Deus, minha Rocha, meu Refúgio, meu Salvador, meu Redentor…”. Mesmo as petições são secas, breves, diretas, todas no imperativo (apenas duas com a adição de um “como”). Não se multiplicam os verbos típicos da oração: “Peço-te, suplico-te, invoco-te, louvo-te…”. Tudo tem por objetivo pedir o essencial, sem uma palavra a mais.
As petições estão divididas em duas partes: as três primeiras são orações – poderíamos dizer – para Deus, as outras quatro são pedidos para nós, homens e mulheres, referindo-se à primeira pessoa do plural. É de sublinhar também que, nesta estrutura de duas partes, o pedido do pão necessário é colocado no centro da oração e que, se a primeira palavra da oração é “Pai”, a última é “mal, Maligno” (Mt 6,13), ou “tentação” (Lc 11,4): desta forma, Jesus sublinha o facto de que a luta espiritual, a travar também com a arma da oração, é um elemento decisivo para toda a vida humana na terra.
Através dos três primeiros pedidos, pedimos que Deus seja Deus, que os seus desejos se realizem, que Deus ocupe o lugar que lhe cabe no mundo e na nossa vida. Por outras palavras, preparamo-nos para aceitar a ação que ele quer realizar em nós e através de nós. “Estas três petições já foram respondidas no sacrifício de Cristo Salvador, mas dirigem-se agora, na esperança, para o cumprimento final, visto que Deus ainda não é tudo em todos (cf. 1 Cor 15, 28)” (CIC2805).
Quanto às quatro últimas petições, todas elas declinadas para “nós”, gostaria de as introduzir com um belo comentário de Tertuliano: “A sabedoria divina dispôs cuidadosamente a ordem desta oração, para que, depois de invocar os bens do céu, a santificação do nome de Deus, o cumprimento da sua vontade e a vinda do seu Reino, houvesse lugar para as necessidades terrenas. Esta ordem corresponde, afinal, ao que o Senhor tinha dito. “Procurai primeiro o Reino de Deus e tudo o mais se vos dará por acréscimo (cf. Mt 6,33)”.
(Família cristã, 30 de junho de 2013)