Comentário ao Compêndio do Catecismo /23
Enzo Bianchi
Na Igreja existem diferentes caminhos de oração, segundo os diferentes contextos históricos, sociais e culturais. Pertence ao Magistério discernir a sua fidelidade à tradição da fé apostólica e aos pastores e catequistas o explicar-lhe o sentido, que é sempre referido a Jesus Cristo.
(Compêndio do Catecismo n. 559)
O caminho da nossa oração é Cristo, porque ela se dirige a Deus nosso Pai, mas aquela só chega até Ele, se, ao menos implicitamente, rezamos no Nome de Jesus. A sua humanidade é, pois, o único caminho pelo qual o Espírito Santo nos ensina a rezar a Deus nosso Pai. Por isso as orações litúrgicas concluem-se com a fórmula: «Por nosso Senhor Jesus Cristo».
(Compêndio do Catecismo n. 560)
O melhor comentário a estas afirmações do Compêndio é um texto célebre do Concílio Vaticano II: “Cristo está sempre presente na sua Igreja, especialmente nas ações litúrgicas… Cristo associa sempre a si a Igreja, sua esposa muito amada, a qual invoca o seu Senhor e por meio dele rende culto ao Eterno Pai” (Sacrosantum Concilium 7).
O Senhor Jesus Cristo é, de facto, o caminho definitivo para Deus (cf. Jo 14, 6) e a sua prática de humanidade constitui o caminho oferecido à nossa humanidade e às diversas formas da nossa oração, que se realiza sempre “por Cristo, com Cristo e em Cristo”. Já nos debruçámos anteriormente sobre a oração de Jesus e o ensinamento que dessa resulta para a oração dos seus discípulos. Aqui, pelo contrário, gostaria de salientar que depois da humanização de Deus em Jesus, depois que “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14), certamente a humanidade de Jesus é um modelo para nós, para “salvar” a nossa vida. Mas há mais: depois da sua morte e ressurreição, somos chamados a acolher Jesus Cristo na sua presença como Senhor e a aceitar que Ele venha com o Pai para habitar em nós (cf. Jo 14,23), através do Espírito Santo. E acolher Cristo não significa apenas habitar n’Ele, mas tornar-se a sua morada, isto é, experimentar a vida de Cristo em nós, a ponto de confessar: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).
Trata-se de uma experiência capital para o crente, a ponto de a consciência de “Cristo em nós” (cf. Rm 8,10; Cl 1,27) se tornar o critério para discernir a qualidade da nossa fé cristã e da nossa oração, como nos recorda de novo o apóstolo Paulo, quando convida os cristãos a pôr-se à prova: “Não reconheceis que Jesus Cristo habita em vós?” (2 Cor 13,5). Em virtude desta habitação recíproca, podemos fazer nossa a oração de Cristo: esta é a oração cristã, na qual o Espírito Santo nos conforma cada vez mais ao Filho na sua constante orientação para o Pai, leva-nos a assumir o seu sentir (cf. Fil 2,5), o seu pensar (cf. 1Cor 2,16) e o seu agir (cf. Col 1,10; 1Jo 2,6).
Compreendemos então que “rezamos bem quando a nossa vontade e todo o nosso coração estão unidos à oração de Cristo. Só em Jesus Cristo podemos rezar; e é também com Ele que seremos ouvidos” (Dietrich Bonhoeffer).
(Família cristã, 27 de janeiro de 2013)