Comentário ao Compêndio do Catecismo /47
Enzo Bianchi
A Igreja pede a vinda final do Reino de Deus mediante o regresso de Cristo na glória. Mas a Igreja reza, também, para que o Reino de Deus cresça, já hoje, graças à santificação dos homens no Espírito e graças ao seu empenho ao serviço da justiça e da paz, segundo as Bem-aventuranças. Este pedido é o grito do Espírito e da Esposa: «Vem Senhor Jesus» (Ap 22,20).
(Compêndio do Catecismo nº 590)
A petição: “Venha a nós o vosso Reino” ocupa o lugar central das três primeiras petições, o que demonstra a sua importância. Não é por acaso que o anúncio fundamental de Jesus é o do Reino, como atestam as suas primeiras palavras públicas: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo; arrependei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc 1,15).
O discípulo pede que o Reino de Deus – que deve ser entendido como o equivalente da expressão bíblica: “O Senhor reina! Deus reina!” (cf. Ex 15,18; Is 52,7, etc.) – se manifeste, se estenda, se realize. Invocar a vinda do Reino significa pedir que Deus reine, antes de mais, sobre os orantes, depois sobre todos os cristãos, depois sobre cada ser humano e sobre toda a humanidade. E o que aparece em todas as Escrituras, recapitulado por Jesus, é que o reino de Deus não é como o dos homens: não é uma dominação ou o estabelecimento de uma escravidão, mas é uma ação de libertação da escravidão dos falsos ídolos, de salvação dos inimigos e do mal, de reunião dos filhos dispersos (cf. Jo 11,52).
O Reino de Deus manifestou-se em Jesus, “o Reino feito pessoa” (Orígenes), porque é o único homem sobre o qual Deus reinou em plenitude. Ele anunciou o Reino narrando parábolas em que mostrava o que acontece quando a ação de Deus encontra espaço na história, quando o coração dos homens está disposto a acolher o seu dom e a responder-lhe com toda a sua vida. O Reino de Deus é uma realidade que se espera e se invoca, para a qual tudo deve ser preparado através da conversão, do regresso ao Senhor; é uma realidade que não se pode forçar, mas que se acolhe como as crianças (cf. Mc 10,15 e par.); é uma realidade que não deve ser contrariada, mas que surge do modo como uma pessoa, uma comunidade, a Igreja, deixa que Deus reine sobre ela.
No crente, a expetativa das realidades últimas, do Reino de Deus, de estar com o Senhor para sempre, da vida eterna, deve ser uma tensão constante. “Marana tha: vem, Senhor Jesus!” (1 Cor 16,22; Ap 22,20) é a invocação que testemunha esta expetativa do cristão e da Igreja. É certo que o Reino já começou a estar presente entre nós em Jesus (cf. Lc 17,21); está inaugurado mas não concluído, cresce todos os dias sem que saibamos como nem possamos verificar a sua extensão. Por isso, podemos perguntar-nos: a vinda do Reino refere-se ao fim dos tempos ou já está a acontecer hoje? As duas respostas são válidas. De facto, nos Evangelhos, o Reino é por vezes indicado como realidade futura, outras vezes como presente; é um Reino inaugurado por Jesus na história e é um Reino que cresce progressivamente; é um Reino que já aqui e agora tende para o seu cumprimento final, quando se dará a sua manifestação definitiva: então haverá o banquete em que todos os homens se sentarão à mesa do Reino (cf. Mt 8, 11; Lc 13, 29) e o próprio Senhor virá servi-los (cf. Lc 12, 37), para dar início a um banquete sem fim.
(Família Cristã, 14 de julho de 2013)