Comentário ao Compêndio do Catecismo /28
Enzo Bianchi
Todos os momentos são indicados para a oração, mas a Igreja propõe aos fiéis ritmos destinados a alimentar a oração contínua: orações da manhã e da noite, antes e depois das refeições, liturgia das Horas; Eucaristia dominical; Santo Rosário; festas do ano litúrgico.
(Compêndio do Catecismo nº 567)
Noutros artigos debruçámo-nos sobre algumas das formas de oração evocadas pelo Compêndio. Poderíamos deter-nos aqui no ano litúrgico, que configura não um tempo cíclico, mas um tempo aberto ao único acontecimento que nós, cristãos, devemos esperar com perseverança: a vinda gloriosa do Senhor no fim dos tempos. Com esta consciência fundamental, aderir com convicção aos ritmos do ano litúrgico leva-nos a contemplar os mistérios da vida de Jesus Cristo; ou melhor, o mistério de toda a vida de Cristo, tornada presente pela liturgia.
Gostaria, porém, de me deter aqui numa questão que está na raiz da relação entre oração e tempo. Refiro-me à afirmação que muitas vezes aparece nos nossos lábios: “Não tenho tempo para rezar”. É claro que se deve dizer que a vida atual é marcada por ritmos de trabalho frenéticos e compromissos múltiplos, que já não são os dos antigos tempos bíblicos ou mesmo de algumas gerações anteriores à nossa. E, no entanto, é preciso denunciar que a falta de tempo é quase sempre um álibi: é bem sabido, de facto, que nós, homens, encontramos sempre tempo para aquilo que nos é querido… É preciso dizer claramente: quem afirma não ter tempo para rezar confessa-se, na realidade, idólatra. Porque não é ele que determina o seu próprio tempo, mas é o tempo que o domina.
Não é por acaso que ordenar o tempo é o princípio fundamental da fé judaico-cristã: reservar tempo para Deus, “santificar” o tempo, ou seja, considerar como “outros” os tempos, distintos daqueles destinados ao trabalho, é o sentido das festas, dos ritmos da oração. Um sacrifício inteiramente consumado para Deus e possível a todos é precisamente a oferta a Deus do tempo, o bem mais precioso que o homem possui. Além disso, santificar uma parte do tempo e consagrá-la à oração é já, de certo modo, aceitar morrer, perder um pouco da vida pelo Senhor: talvez dar tempo a Deus seja tão difícil porque significa confrontar-se com a própria morte… Por outro lado, quem diz acreditar na vida eterna, como pode viver essa fé se não consagra o tempo para entrar em comunhão com Deus aqui e agora?
O aspeto da disciplina do tempo não é, portanto, marginal, mas central na oração. É preciso dar a si mesmo tempos determinados e ser fiel a eles, para que não se reze apenas quando se tem vontade; não, a oração é o esforço quotidiano, é o alimento quotidiano da vida no Espírito. Matta el Meskin, um grande pai espiritual do monaquismo egípcio do século XX, escrevia: “Não deves entristecer-te com a escassez de tempo disponível para te isolares no quarto; deves, pelo contrário, certificar-te de que estás pronto e cheio de vontade de comunicar com Deus: então perceberás que os minutos podem ser como dias”.
(Família cristã, 3 de março de 2013)