Qual a importância da Tradição em relação à oração?

Comentário ao Compêndio do Catecismo /21

Enzo Bianchi

Na Igreja, é através duma Tradição viva que o Espírito Santo ensina os filhos de Deus a orar. A oração não se reduz, com efeito, ao brotar espontâneo dum impulso interior, mas implica contemplação, estudo e compreensão das realidades espirituais que se experimentam.

(Compêndio do Catecismo n. 557) 

“A oração não se reduz ao brotar espontâneo dum impulso interior: para orar, é preciso querer. Tão-pouco basta saber o que a Escritura revela sobre a oração: é preciso também aprender a rezar. Ora, é através duma transmissão viva (a Tradição sagrada), que o Espírito Santo, na «Igreja crente e orante», ensina os filhos de Deus a orar” (CIC 2650).

Com estas palavras, o Catecismo recorda-nos que, assim como a fé se transmite (cf. 1 Cor 15, 3), assim também a oração é a expressão da fé, a sua eloquência (cf. Tg 5, 15: “oratio fidei”). É precisamente esta traditio que respeita e honra o que a fé e a oração são: um dom que vem de Deus. Além disso, como vimos num artigo anterior, já o Evangelho atesta a compreensão da oração como algo que deve ser transmitido e ensinado: “Jesus estava num lugar a rezar; quando acabou, um dos seus discípulos disse-lhe: “Senhor, ensina-nos a rezar, como João ensinou também aos seus discípulos”” (Lc 11,1).

Mais adiante, entraremos em pormenores sobre os elementos que constituem a grande Tradição da Igreja, entre os quais o ensinamento dos Padres e o testemunho vivo da liturgia. Por agora, gostaria de me concentrar naquilo que representa o fundamento da aceitação da Tradição por parte dos crentes: o sensus fidei. Lemos num belo texto conciliar: “A totalidade dos fiéis que receberam a unção do Santo (cfr. Jo. 2, 20 e 27), não pode enganar-se na fé; e esta sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do povo todo, quando este, «desde os Bispos até ao último dos leigos fiéis» (Agostinho), manifesta consenso universal em matéria de fé e costumes” (Lumen Gentium 12).

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Com a sua “unção mestra” (Bernardo de Claraval), o Espírito dá ao povo de Deus o discernimento pessoal, ou seja, a capacidade de conhecer as coisas da fé que é própria de cada batizado e da Igreja no seu conjunto. É assim que – continua a LG 12 – “com este sentido da fé, que se desperta e sustenta pela ação do Espírito de verdade, o Povo de Deus, sob a direção do sagrado magistério que fielmente acata, já não recebe simples palavra de homens mas a verdadeira palavra de Deus (cfr. 1 Tess. 2,13), adere indefetivelmente à fé uma vez confiada aos santos (cfr. Jud. 3)”.

Reavivando o nosso sensus fidei, poderemos renovar a nossa oração e “despertar continuamente a nossa vida de fé, em particular através de uma reflexão cada vez mais profunda, guiada pelo Espírito Santo, sobre o conteúdo da própria fé” (Joseph Ratzinger).

(Família cristã, 13 de janeiro de 2013)

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